Era um tempo em que a inocência ainda permanecia imaculada naqueles espíritos sublimados numa Inglaterra rural e sem culpas.
Willian era um garoto introvertido em seu mundo claro e sem definições firmadas. Tinha 19 anos, vividos alheios ao mundo que fervilhava silencioso em todos os seus matizes. Mas seu mundo sem cores mudou...
Subitamente, Willian descobriu que havia uma estranha afinidade entre ele e seu professor, sr. Inger. Era um homem bonito, de vinte e nove anos, um típico jovem moderno para seu tempo, aparentemente destemido, cuja prápria independência revelava o seu pesar. Era inteligente e competente no que fazia, preciso, eficiente, impressivo.
Sempre proporcionava satisfação a Willian, por causa de sua aparência franca e decidida, mas graciosa. Mantinha a cabeça empinada, um pouco inclinada para trás, Willian achava que havia uma impressão de nobreza na maneira como ele penteava os cabelos castanhos lisos. Usava blusas limpas, bem engomadas, calças bem cortadas. Tudo nele era ordenado, indicando um espírito lúcido, fazendo com que se tornasse um prazer assistir à sua aula.
A voz também era precisa, sonora, com uma modulação firme e requintada. Os olhos eram azuis, claros, orgulhosos, ele transmitia a impressão de uma pessoa de excelente índole, meticulosamente arrumado, uma mente inflexível. Contudo, havia nele uma infinita pungência, algo patético em sua boca fechada, na solidão e no orgulho.
Antes do despertar de Willian para o sentimento rubro que nascia em seu espírito, haviam sido bons amigos, Ã maneira indefinida da sala de aula, no relacionamento profissional de professor e aluno sempre presente. Agora, no entanto, outra coisa aflorou. Quando se encontravam juntos na sala, havia uma percepção da presença um do outro, quase com a exclusão de tudo o mais. Inger sentia um prazer intenso nas aulas quando Willian estava presente. Willian experimentava a sensação de que toda a sua vida começava quando o sr. Inger entrava na sala. E com a presença do amado e sutilmente íntimo professor, o menino sentava como se houvesse em seu íntimo os raios de algum sol enriquecedor, cujo calor inebriante se despejava diretamente em suas veias.
O estado de bem-aventurança, quando o sr. Inger estava presente, era supremo no garoto, mas sempre ansioso, muito ansioso. Ao voltar para casa, Willian sonhava com o professor, elaborava sonhos infinitos de coisas que podia dar a ele, do que podia fazer para que o mestre o adorasse.
O sr. Inger era bacharel em artes e estudara em Newnham. Era filho de um clérigo, de boa família. Mas o que Willian mais adorava era seu porte empertigado, atlético, a natureza indomitamente orgulhosa. Ele era orgulhoso e livre como um homem de seu tempo, mas ao mesmo tempo refinado como uma mulher.
O coração do menino ardia dentro do peito ao partir para a escola pela manhã. Ah, havia tanta ansiedade em seu peito, tanta alegria em seus pés, ao se encaminhar ao encontro de seu amado! Ah, o sr. Inger, como suas costas eram retas, como eram fortes suas pernas, como eram serenos e livres os seus braços!
Willian ansiava incessantemente em saber se o sr. Inger gostava dele. Ainda não houvera qualquer sinal definido entre os dois, sá intenções veladas que podiam muito bem não ser nada. Mas com toda certeza, sem a menor dúvida, o sr. Inger também o amava, gostava dele, no mínimo apreciava-o mais que ao restante dos alunos da turma. Sá que lê não tinha certeza. Era possível que o sr. Inger não se importasse com ele. E, no entanto, com o coração ardendo, Willian sentia que saberia, se ao menos pudesse falar com ele mais intimamente, tocá-lo até.
O período de verão chegou, e com ele as aulas de natação. O sr. Inger daria o curso de natação. Willian tremeu, ficou atordoado de paixão. Suas esperanças se consumariam em breve. Veria o sr. Inger em roupa de banho.
O dia chegou. A água faiscava na piscina, um pálido verde-esmeralda, uma massa de cor adorável e reluzente, dentro dos limites brancos que pareciam mármore. A luz caía suavemente por cima, e a grande massa verde de água pura movimentava-se por baixo, como se alguém tivesse mergulhado do lado.
Willian, tremendo, mal conseguindo se controlar, tirou as roupas, pôs o traje de banho e abriu a porta de sua cabine. Dois rapazes estavam na água. O professor ainda não aparecera. Ele esperou. Uma porta se abriu. O sr. Inger saiu, vestindo um calção de banho vermelho-ferrugem, colado em seu corpo. Como estava deslumbrante! Os joelhos eram muito brancos e fortes, ele tinha o corpo firme e musculoso como Apolo. Encaminhou-se para o lado da piscina e se lançou na água com um movimento negligente. Por um momento, Willian ficou observando os ombros brancos, suaves e fortes, os braços ágeis nadando. E depois também mergulhou.
Agora, ah, agora, estava nadando na mesma água com seu querido professor. Movia braços e pernas voluptuosamente, nadava sozinho, deliciado, mas ainda com um anseio de insatisfação. Queria tocar no outro, senti-lo.
- Apostarei uma corrida com você, Willian – soou a voz bem modulada.
Willian estremeceu violentamente. Virou-se para deparar com o rosto animado e franco de seu professor, a fitá-lo. Fora reconhecido. Rindo, a sua risada bela e surpresa, ele começou a nadar. O professor estava um pouco à frente, nadando com braçadas firmes. Willian podia ver as cabeça inclinada para trás, a água escorrendo pelos ombros brancos, as pernas fortes em movimento incessante. E nadou ofuscado pela paixão. Ah, a beleza da carne firme, fria e viçosa! Ah, aquelas perna maravilhosas! Se pudesse ao menos segurar aqueles braços , enlaçar o professor, comprimir seu peito incipiente contra aquele corpo de deus! Ah, se não desprezasse tanto o seu práprio corpo, magro e melancálico, se ao menos fosse também destemido e capaz...
Nadou com a maior ansiedade, não querendo vencer, querendo apenas ficar perto de seu professor, nadar em disputa. O sr. Inger tocou o cano, virou-se e pegou Willian pela cintura na água, mantendo-o contra seu corpo por um instante. E os dois corpos se tocaram , tremeram um contra o outro por um momento, depois se separaram.
- Venci – disse o sr. Inger, rindo.
Houve um instante de suspense. O coração de Willian batia depressa demais, ele se segurou na grade, não conseguia se mexer. Seu rosto dilatado, afetuoso e radiante virou-se para o professor, como se fosse o práprio sol.
- Adeus – disse o sr. Inger, nadando para os outros alunos, demonstrando um interesse apenas profissional.
Willian ficou atordoado. Ainda podia sentir o contato do corpo do professor contra o seu – apenas isso. O resto da aula de natação transcorreu como um transe. Quando soou a chamada para deixar a água, o sr. Inger desceu pela piscina em direção a Willian. O calção vermelho-ferrugem aderira a ele, deixando todo o quadril bem definido, firme e magnífico, na visão do garoto.
- Gostei muito de nossa corrida, Willian – disse o sr. Inger – E você?
O garoto pôde apenas sorrir, com o rosto radiante, aberto, revelado.
O amor estava agora tacitamente confessado. Mas algum tempo passou antes que houvesse qualquer progresso adicional. Willian continuou em suspense, numa felicidade inflamada.
E um dia, quando estava sozinho, o professor aproximou-se, tocou em seu rosto com os dedos, indagou com alguma dificuldade:
- Gostaria de tomar um chá comigo no sábado, Willian?
O menino corou de gratidão.
- Iremos para um pequeno e adorável bangalô no Soar, está bem? às vezes passo os fins de semana lá.
Willian ficou fora de si. Não podia suportar esperar até sábado, seus pensamentos ardiam como o fogo. Se ao menos já fosse sábado, se ao menos já fosse sábado...
E depois o sábado chegou ele partiu. O sr. Inger encontrou-o em Sawley, e caminharam cerca de cinco quilômetros até o bangalô. Era um dia nublado, quente e úmido.
O bangalô era bem pequeno, apenas três cômodos, numa encosta íngreme. Tudo era requintado. Em deliciosa intimidade, os dois fizeram o chá e depois conversaram. Willian inventara uma desculpa mirabolante para dormir fora de casa.
E a conversa foi levada como que por encantamento para o amor. O sr. Inger estava contando a Willian a histária de um amigo que tinha um amor proibido e sofria por não poder vivenciá-lo para a sociedade, até que se matou; e depois falou de uma prostituta e de suas práprias experiências com mulheres que nunca chegou a amar.
Enquanto conversavam assim, na pequena varanda do bangalô, a noite caiu, começou a chuviscar.
- Está muito abafado – comentou o sr. Inger.
Eles observavam um trem, as luzes pálidas no crepúsculo persistente, correndo à distância.
- Vai trovejar – murmurou Willian.
O suspense elétrico continuou, a escuridão se aprofundou, eles foram eclipsados.
- Acho que vou descer a dar um mergulho – disse o sr. Inger, da escuridão.
- à noite?
- É melhor ainda. Vem comigo?
- Eu gostaria.
- É bastante seguro... o terreno é particular. Podemos nos despir no bangalô, por causa da chuva, depois desceremos correndo.
Tímido, rígido, Willian entrou no bangalô e começou a tirar as suas roupas. A luz do lampião estava reduzida ao mínimo, ele se encontrava nas sombras. Junto de outra cadeira, Inger se despia.
E logo o vulto nu e escuro do homem mais velho se aproximou do mais novo.
- Está pronto?
- Um momento.
Willian mal conseguia falar. O outro, nu, estava parado ao seu lado, em silêncio. Willian estava pronto.
Saíram para a escuridão lá fora, sentindo o ar suave da noite em suas peles.
- Não estou vendo o caminho – murmurou Willian.
- É por aqui.
O vulto pálido e imponente estava ao seu lado, uma mão segurou seu braço. E o mais velho manteve o mais moço bem junto. à beira da água, ele enlaçou Willian e beijou-o. E naquela união de lábios, Willian sentiu uma presença sobrenatural e esplêndida, nunca o haviam beijado. Toda a noite se comprimiu solidária e o universo esteve singular numa conjunção cásmica. O professor levantou seu menino no colo, aconchegado, murmurando:
- Vou carregá-lo para a água.
Willian ficou imável nos braços do professor, a testa encostada naquele peito amado, que o levava à loucura.
- Vou larga-lo agora – disse Inger.
Mas Willian comprimiu seu corpo contra o do professor.
Dali a pouco, a chuva caiu mais forte em seus corpos quentes, afogueados, surpreendente, deliciosa. E logo um aguaceiro gelado se despejava sobre eles, proporcionando um prazer intenso.
O professor gemia dentro da água:
- Sim! Sim!
E fechava seu aluno entre os braços, como entre duas colunas, e pondo em contato com o dele todo o seu corpo nu. Willian arfava e também gemia. O peito forte do homem tocava com força o do menino, enquanto seu membro duro, já enorme, roçava o pênis do garoto, queimando seu desejo no gelo das águas da noite.
Incorporando todo o ambiente, sentindo a noite, os campos, o lago, a natureza selvagem, os dois afloraram o puro instinto animal. Saíram loucos de desejo do lago e foram para a margem. Inger virou Willian com brusquidão e o penetrou com violência, sem nenhuma preparação. O menino virgem gritava, espolinhava-se todo, cerrando os dentes, fremindo-lhe a carne em crispações de espasmo. Por cima, o professor, doido de luxúria, irracional, feroz, revoluteava, em corcovos de cavalo sobre as nádegas de seu pupilo. E metia-lhe a língua tesa pela boca e pelas orelhas, e esmagava-lhe os olhos debaixo de seus beijos lubrificados de espuma sexual, e mordia-lhe o lábulo dos ombros, e agarrava-lhe convulsivamente o cabelo, como se quisesse arrancá-lo aos punhados. O enorme membro de Inger rasgava a bundinha do garoto, fazendo o sangue escorrer abundante. Willian mordia a grama e fincava os dedos na terra num desespero que podia ser de dor ou de prazer, certamente de ambos.
A chuva continuava caindo abundante e gelada, molhando aqueles dois corpos nus, unidos, formados em um, loucos em desejo carnal.
Até que, num assomo mais forte, Inger devorou seu jovem amante num abraço de todo o corpo, ganindo ligeiros gritos, secos, curtos, muito agudos, gozando enfim fartamente, lambuzando a bunda de Willian, misturando esperma com sangue. Depois desabou para o lado, exânime, inerte, os membros atirados num abandono de bêbado, soltando de instante a instante um soluço estrangulado.
O menino, ainda de bruços, continuava com o rosto na grama molhada, as lágrimas diluídas pela chuva, as nádegas vermelhas.
Agora parecia que ambos evitavam se olhar. Inger fitava o céu sem estrelas. Willian olhava para a terra encharcada. O menino fantasiara seu amor como um conto maravilhoso de fadas, onde seu mestre amado o receberia para sempre, cheio de carinho, companheiro, amoroso. Mas não estava realmente preparado para o amor da carne, para o desejo que inflama os corpos até consumi-los em luxúria e loucura. Mas, apesar da dor, apesar de toda a brusquidão de sua experiência, ele havia de certa forma gostado de tudo aquilo, e pela primeira vez na vida, sentiu o verdadeiro desejo sexual, sentiu seu corpo como fonte de prazer e receptáculo de gozo.
Até que Inger chegou-se ao seu jovem amante e beijou-lhe a testa. Willian olhou humilde e murmurou como se fossem suas últimas palavras:
- Eu te amo!
Abraçaram-se e se beijaram. A noite continuou chuvosa e os dois voltaram para o bangalô, saciados.
Pela manhã, no entanto, o amor estava outra vez ali, ardendo, ardendo. Iger perguntou:
- Você já teve relações alguma vez antes de ontem?
- Não – Willian respondeu, sempre tímido.
- Quer saber como é possuir uma pessoa?
Os olhos de Willian brilharam. No que o professor estaria pensando?
Inger despiu-se e pediu para Willian fazer o mesmo. Tocou delicadamente o pênis do rapaz até endurecê-lo e o envolveu com a boca. Willian nunca tinha ouvido falar numa coisa daquela. Sabia, é claro, que um homem penetra uma mulher. Sabia até mesmo, porque se comentava que havia destas abominações, que dois homens podiam se amar. Mas nunca ninguém lhe havia dito que um amante, seja homem ou mulher, podia tocar com a boca os árgãos sexuais do parceiro.
Inger sugava, indo e vindo, lambendo com a ponta da língua de quando em vez. Willian torcia-se com tamanho prazer... estava louco! Devagar, o homem foi levantando-se aos poucos, subindo sua língua voraz pela barriga do menino, beijando seus pequenos mamilos, aninhando-se em sua boca.
- Quero que você me ame, Will, como te fiz ontem!
Virou-se de lado na cama e com suas mãos de homem experiente guiou o membro do garoto, lubrificado de saliva, para dentro de si.
Willian penetrou-o extasiado. Abraçou seu professor e o amou, mexendo-se atrás dele.
- Com mais força, amor! – suplicou Inger.
O aluno intensificou seus movimentos num vai-e-vem alucinado, enquanto beijava e mordia a orelha de seu amante. Lançaram-se num vale escuro, para longe, muito longe, para a escuridão prístina do paraíso, para a imortalidade original. Ingressaram nos campos escuros da imortalidade dos amantes. Corpo e alma. Eternidade. E ambos gozaram. E ambos, homem e menino, sentiram-se ricos e abundantes. Depois do amor, beijaram-se. Willian esperou seu Inger. A angústia no garoto era a angústia que queria, a agonia era a agonia que queria. Estava absorvido, enredado na vibração poderosa da noite. Quem era Inger? Seu homem, uma vibração poderosa que o envolvia.
E naquela noite, e naquele dia, Willian cresceu de menino a homem, de cordeiro a leão. Porque se o cordeiro pudesse deitar com o leão, seria uma grande honra para o cordeiro, mas o coração poderoso do leão não sofreria qualquer diminuição. Antes sá podia ter medo e submeter-se trêmulo ao medo, tornar-se sacrifício como um cordeiro; sá podia submeter-se ao amor e tornar-se passivamente amado.
Mas agora descobrira o mundo dos amantes. Amantes irados, destrutivos, corpos e sangue, prazer e angústia, procurando o momento em que o medo é maior, o triunfo é maior, o medo não maior do que o triunfo, o triunfo não maior do que o medo. Ele esticava os braços e pernas como um leão ou um cavalo selvagem, seu homem dormindo ao lado, e sentia o coração implacável em seus desejos. Sofreria mil mortes, mas ainda seria um coração de leão quando se levantasse da morte, um leão ainda mais feroz ele seria, mais seguro, sabendo-se diferente e apartado do vasto e conflitante universo que não era ele práprio.