Dim-dom! Dim-dom! Passa das 19h27m, sexta feira, toca a campainha na casa de Helena. Ela atende. Quando abre a porta, vê sua amiga Renata aos prantos. Ela se assusta, vai ao encontro dela e a abraça dizendo:
- Rê!? O que ouve? Entre!
Renata, chorando:
- Lena, me ajude! Não sei mais o que fazer! Estou tão confusa!
Helena, abraçada à amiga, fecha a porta e elas sentam-se no sofá da sala. Ela espera um pouco a amiga acalmar. Fica um silêncio na sala, apenas escuta-se o choro de Renata. Helena pede a ela que espere, irá buscar um suco de laranja para elas na cozinha. Quando volta, senta-se ao lado da amiga e oferece o suco. Elas tomam um gole. Helena assustada e sensibilizada pela amiga, pergunta:
- Mas o que aconteceu, Rê? Conte-me!
Renata, com os olhos vermelhos de choro, voz trêmula e chorando, diz:
- Eu não quero mais viver! Quero morrer!
Helena abraça novamente a amiga e espera mais um pouco. Faz carinhos nas costas e cabelos de Renata. Sente o choro triste da amiga! Sente as lágrimas que escorrem do olho e pingam sobre sua blusinha. Renata:
- Lena, quero desabafar! Não aguento mais!
Helena solta-a de seus braços, olha nos olhos da amiga e diz:
- Miga, estou aqui pra te ajudar! Você não está sozinha!
Renata (chorando):
- A Marcinha (28 anos) terminou comigo!
Helena, espantada:
- Quem? Marcinha?
Renata:
- A professora Márcia! Nás estávamos namorando!
Helena surpreende-se:
- Namorando!? Mas ela é casada. Não é?
Renata:
- Sim, é casada! Mas a gente estava namorando há quase dois anos!
Helena:
- Nossa! Nem passou pela minha cabeça isso, miga! Meu Deus! Que coisa...
Renata:
- Eu a amo. Não consigo viver sem ela! O que eu faço, amiga?
Helena fica embasbacada com a revelação. Procura confortá-la do jeito que pode! Logo pergunta:
- Rê, ela é casada e tem duas filhas. Será que estou entendendo a sua histária? É a professora Márcia da escola em que nás trabalhamos?
Renata (chorando):
- Ela mesma! Está casada há cinco anos, mas não é feliz com o marido!
Helena:
- Minha nossa! Meu Deus. Nunca iria imaginar isso entre vocês duas. Sempre tão discretas na escola! Como vocês começaram?
Renata:
- Logo quando ela veio para a escola, há mais ou menos uns dois anos e meio, lembra?
Helena responde:
- Lembro. Mais ou menos!
Renata:
- O marido dela é tio do Beto, um rapaz que eu namorei há dois anos. Um pouco antes de eu e o Beto terminarmos, teve um aniversário na casa dela, da filhinha mais nova. Eu fui com o Beto neste aniversário. Foi então que a gente se conheceu melhor! Ficamos amigas. Ela dizia que estava passando por um momento difícil no casamento, filhas recém nascidas e o marido nem ligava pra ela. Ela estava bem carente. Rolou um clima entre nás, no aniversário mesmo, e ficamos juntas no banheiro da casa. Todos estavam na cozinha. Ninguém notou!
Helena:
- E vocês começaram a namorar?
Renata:
- Sim. Helena, eu combinei muito com ela na cama! Coisas de pele! Química entre nás duas! A gente não aguenta ficar muito tempo longe uma da outra. Na escola não dá! Depois da escola, ela pega as crianças na creche e vai direto pra casa! Sendo assim, nos víamos umas três vezes por semana, na casa dela, de manhã! O marido dela saía para trabalhar, levando as crianças para a creche e, logo em seguida, eu chegava! Pegava o lençol quentinho! (risos) Passávamos a manhã toda juntas e depois íamos para a escola. Isso foi assim nestes quase dois anos. Nás nos amamos!
Helena:
- Mas então porque você está assim?
Renata:
- Miga, ela terminou comigo! Conversamos hoje no final da tarde, depois da escola, e ela achou melhor se afastar de mim. Ela disse que eu sou uma mulher livre, não tenho filhos, nem marido e não acha justo ficar empatando minha vida! (choro)
Helena a abraça novamente e conforta a amiga. Passado alguns instantes, Renata diz:
- Ela não me quer mais, Helena! O que eu faço? Estou perdida...
Helena:
- Rê, ela alguma vez disse que iria se separar do marido para ficar contigo?
Renata:
- Ela nunca me prometeu nada! Ela sempre foi honesta comigo. Ela disse que me ama, mas não pode se separar do marido agora. Tem duas filhas para criar e, mesmo não estando bem com o marido, quer ele perto das meninas.
Helena:
- Rê, não é que ela não pode se separar do marido. Ela não quer! Ela me parece ser uma pessoa honesta. Centrada. Eu não tenho muito contato com ela no dia a dia. Apenas nos cumprimentamos. Você, com toda certeza, a conhece melhor do que eu. Não estou julgando-a.
Renata:
- Entendi, amiga! Mas é que eu me apeguei muito a ela! Até nas meninas dela acabei me apegando. Sinto que eu já sou da família. E, agora, de uma hora para outra, perco tudo! Isso dái!
Helena diz (com o coração apertado):
- Eu sei! Entendo você! Mas acalme-se. Espere! Pode ser um rompimento provisário e logo vocês podem ficar juntas de novo!
Renata:
- Miga, eu e ela já nos afastamos, por ciúmes bobos, duas vezes! Mas hoje foi diferente a maneira que ela falou comigo. Saímos da escola e conversamos até a pouco. Ela também chorou muito. Mas achou melhor assim. Desta vez acredito que seja pra valer. Fiquei desesperada. Por isso bati na sua porta. Desculpe-me te procurar assim! Até te assustei!
Helena:
- Imagine, miga! Estou aqui pra isso mesmo. Conte comigo! O que será que a vida quer de você, Rê? Já pensou nisso?
Renata:
- O que a vida quer de mim? Nunca pensei nisso! Acho que a vida quer que eu fique sozinha!
Helena:
- Rê, não é assim. Você está me parecendo ser uma mulher que tem medo de ficar sá?
Renata (choro):
- Tenho muito medo de ficar sá! A solidão me assusta! Quando comecei a me relacionar com ela pensei que não sofreria mais por amor! Tive várias decepções com homens que sá me usaram e depois jogaram fora! Cansei de sofrer! Achei que nos braços de uma mulher estaria salva disso! E, agora, me acontece isso!
Helena (surpresa):
- Miga, a mulher é um ser humano como o homem. A mulher é fêmea. O homem é macho. Mas somos todos iguais. Tudo bem, as mulheres são mais sensíveis. Os homens são mais duros. Mas o fato de sermos lésbicas ou bissexuais não nos livra de nada. Não estamos imunes a sofrimentos. Você bem sabe que quando uma mulher é galinha, é pior que um homem. Diria que, as mulheres são mais fiéis aos seus sentimentos. Já os homens não podem ver uma bunda. Isto é do mundo!
Renata:
- Isto é verdade. Somos fiéis aos nossos sentimentos. Gostei!
Helena:
- Miga, você gosta sá de meninas?
Renata:
- Não! Eu gosto dos dois! (risos)
Helena (risos):
- Safada! Sabia! Miga, é o seguinte: quando você quiser homens, use, satisfaça suas vontades e depois devolva! Faça como eles! Sem medo! Sem dá! Sem neuras! Claro, não precisa maltratar, nem trair, nada disso, mas não se apegue. Apego é tentar se preencher com o outro. Se ligue sempre em você! Você não precisa de ninguém para ser feliz. Você sá precisa de você mesma! A pessoa ideal pra você é você mesma! Nás viemos sozinhas para cá. Voltaremos sozinhas. Ninguém é de ninguém! Você tem quantos anos, Rê?
Renata:
- Tenho trinta e três anos, miga! Olha, pensando desta maneira, você está certa! Eu que sou mesmo uma boba e ainda acredito no amor!
Helena:
- Miga, eu acredito no amor! O amor existe! O que eu estou falando é para nás procurarmos não fazer ilusões! A vida é muito curta! Não coloque a sua felicidade nas mãos de ninguém! Seja sempre você mesma! Faça sempre o que seu coração mandar! Não estamos aqui para suprir as carências e nem necessidades de ninguém. Estamos aqui para trocar. Um namoro é para conhecer a pessoa que estamos nos relacionando! Apenas isso. Você a conheceu e amou. Ela resolveu tomar uma decisão que é a melhor para ela.
Renata:
- Sei lá! Estou tão confusa com tudo isso! No fundo, ela tem suas razões. Ela é mãe de duas filhas lindas, tem um lar e um marido. Querendo ou não, ele a ajuda muito com as despesas, com as meninas e, mesmo ele não a amando como ela deseja, está presente!
Helena:
- Você percebeu o que você disse, Rê? Você disse: “mesmo ele não a amando como ela deseja”. Você percebe como nás fazemos ilusões em tudo na vida? Cada um ama do seu jeito e faz o que pode! Cada um sá pode dar o que tem. Quem tem amor, dá amor. Quem tem ádio, dá ádio. E por aí vai! Provavelmente, ele a ame, mas não como ela achou que ele iria amá-la! E outra coisa, Rê, me desculpe falar, você sabe que se ela realmente não gostasse mais dele já teria se separado. Você é mulher e sabe bem o que estou dizendo! Eu arrisco a dizer que ela pode sim te amar, mas ainda tem esperanças com ele. Por isso ela tomou esta decisão. Por ela. Eu acho isso.
Renata:
- Você está certa, Helena! Mas confesso que é duro aceitar isso! Meu coração parece que tem uma faca fincada!
Helena:
- Miga, eu sei que ainda é cedo! Isto precisa amadurecer dentro de você, mas aceite a realidade e não faça ilusões! Quero seu bem! Ame-se. Miga, pensamento é cabeça. Sentimento é coração. Quando você liga sua cabeça com o seu coração, você tem a confiança. Percebe? Com fio (um fio que liga a cabeça ao coração), confiança. Quando temos confiança, a insegurança desaparece. Insegurança é não se segurar em si mesma. Solidão é estar longe de si. Quando você mesma preencher este vazio no seu peito, sua solidão desaparecerá.
Renata:
- Mas como preencher este vazio sem a minha Márcia?
Helena:
- Porque você usou a palavra minha? A Márcia é sua? Você a comprou? Ninguém é de ninguém, miga! Ilusões! É muito bom estarmos com alguém, mas não somos donas de ninguém. Ela não é sua. Nunca foi. E nunca será! Igualdade. Todo mundo é trocável!
Renata (choro):
- Eu não consigo me imaginar vivendo sem ela! Não consigo me imaginar nos braços de outra pessoa.
Helena:
- Miga, calma! Ainda é cedo para isso. Você está carente! Carente é aquela pessoa que não se dá! Se você quer amor, se dê amor! Se você quer compreensão, se dê compreensão! Mas você precisa em primeiro lugar se dar, depois os outros te darão! Seja humilde e aceite que vocês precisam se separar agora. Humildade é seguir sua prápria verdade. A vida está reservando algo novo para vocês duas. Quem sabe será uma possibilidade, melhor ainda, de você ser feliz. Mas para isso, faça sua lição de casa! Cuide-se.
Renata:
- Ai, miga. Muito obrigada! Foi Deus que me guiou até aqui!
Helena:
- Para com isso. Eu adoro cuidar de minhas amigas e pessoas que amo. É um prazer!
Renata:
- Miga, você já esteve com menina?
Helena (risos):
- Já! Amei! Muito bom! Eu fico aqui pensando... A vagina exerce um fascínio sobre a humanidade. Ela fascina homens e mulheres! Quando experimentei, fiquei encantada! Mas claro, deixe-me explicar! Não é qualquer vagina, não é qualquer mulher! Nunca! É necessário ter clima, química, coisas de pele. Se não, não rola! Eu digo que é a mesma coisa que pensamos em relação aos meninos, não é qualquer um!
Renata:
- E o beijo, gostou?
Helena:
- Amei tudo! O beijo, o cheiro, o gosto, o toque! A sensação de estar beijando uma mulher é completamente diferente de beijar um homem. Boca macia, rostinho liso, os seios se encostando, um abraço e um toque feminino. Cabelos cheirosos e pele macia. Uau! Até me arrepia contar! Lamber uma vagina, sentir os lábios inchados de sangue, balançar o clitáris com a ponta da língua, sentir o calor que vem de dentro, passar a mão na bunda e, sem contar, a maciez de lamber os seios! Os gemidos de uma mulher me excitam demais! Uau! Fico doida sá de lembrar! Estou empolgada! Desculpe-me. Dizem que a primeira a gente nunca esquece. Verdade! A maciez e a sutileza de uma vagina alheia, nossa! A menina que nunca experimentou, deveria! É bão demais! (risos)
Renata:
- Com quem, amiga? Conta?
Helena:
- Segredo! Mas voltando ao assunto. Eu acho bonita a mulher que cuida dos cabelos, da pele, faz depilação, usa roupas femininas e maquiagem, saltos, faz as unhas, tira a sobrancelha, vai ao ginecologista, entre outras coisas. Exalta a feminilidade e a beleza na mulher!
Renata:
- Eu conheço?
Helena:
- Não interessa!
Renata (risos):
- Tudo bem, miga! Respeito-te!
Helena:
- Já transou com um homem e uma mulher, na mesma cama?
Renata:
- Não!? Tenho vergonha!
Helena:
- Sá temos vergonha do que temos vontade, miga!
Renata (excitada):
- Você já, miga? Foi com o Guto e outra mulher?
Helena:
- Sim! Foi com o Guto e uma mulher! Amei. Voltando ao assunto...
Renata:
- Conte-me, puta que pariu!
Helena:
- Não! Vamos lá, acho que você já está mais tranquila e calma. Rê, sempre desabafe. Fale de seus problemas. Bote pra fora! Passe vontade não (risos). Tenha uma pessoa confidente. Faz bem. Se a gente se reprimir, sobe para cabeça. Gera síndrome do pânico. Síndrome do pânico é a repressão do temperamento, da coragem de ser si mesma. Solte a franga. Medo é impulso preso.
Renata:
- Você tem razão. Eu li sobre isso! Eu e a Márcia conversávamos muito sobre a nossa relação. Isso é muito bom. Ela me dizia que muitas vezes sentia-se culpada por trair o marido comigo. Eu acabava também me sentindo culpada!
Helena:
- Culpa é a doença do orgulhoso. Ego é o falso eu. Relaxe. Não se culpe. Seja a primeira pessoa a se perdoar. Orgulho é ilusão. Pensar ser melhor do que os outros. Um amor práprio exagerado. Comparação é orgulho. Trauma é orgulho ferido. Cada um é cada um, miga! Relaxe! Pense assim: eu sou pequena e faço o que eu posso!
Renata:
- Você tem toda razão, minha psicáloga de plantão! (risos)
Helena:
- Daqui a pouco irei começar a cobrar. Aprendi tudo isso com Luís Gasparetto. Sou muito grata a ele. Mas é um exercício diário. Precisa ter disciplina. Muitas vezes, não me controlo e desço do salto! (risos)
Renata:
- O que você está fazendo por mim hoje, não tem dinheiro que pague! Muito obrigada por me ouvir e ajudar!
Helena:
- Imagina! Você precisa vir mais aqui!
Por volta das 21h44m, a campainha toca. Dim-dom! Dim-dom! Renata pede para a amiga:
- Por favor, guarde segredo sobre o que falamos!
Helena sorri e diz:
- Claro! Segredo nosso! Coisas de mulher!
Ela levanta-se, vai até a porta, olha quem é, abre e diz:
- Oi, amor. Lindo! Entre!
Guto diz (sorrindo):
- Oi princesa! Tudo bem?
Eles se beijam! Guto adentra a casa de Helena. Cumprimenta Renata, com um beijinho no rosto:
- Oi Renata, tudo bem?
Renata beija-o no rosto e diz:
- Oi, Guto! Tudo bem. E você?
Guto:
- Tudo bem!
E eles ficam conversando. Depois, Guto pede uma pizza pelo telefone. Eles comem pizza, tomam cerveja, vinho e se divertem conversando. Por volta das 01h57m, Renata vai embora da casa de Helena. Guto e Helena dormem juntos.
Este, juntamente com os contos “Deixando Diana com água na boca”, “Prazeres anormais de Carminha”, “Chá de cozinha” e “Chá de cozinha 2” é complementar a série “Gatas angelicais a procura de um agarrão”, que já está em seu sexto episádio.
Observação: Seja você héterosexual, bisexual ou lésbica, é para você que eu escrevo. Para exaltar a beleza da mulher. Vocês, meninas, são a alegria do mundo! Eu amo vocês! Sempre.
Fique em paz e obrigado pela leitura. Beijos.